Envio gratuito para Portugal Continental em compras superiores a 50 €. Para as Ilhas, a partir de 60 €
Envios
Outros pontos de venda
Ver mais
  • Home
  • My health
  • O Lado Oculto da Junk Food: Nem Sempre o IMC Conta a História Toda
Published on 18-06-2025

O Lado Oculto da Junk Food: Nem Sempre o IMC Conta a História Toda

O Lado Oculto da Junk Food: Nem Sempre o IMC Conta a História Toda
Para o post deste mês, repescamos um artigo de 2019, que abalou a comunidade médica por descrever o caso de um jovem inglês que desenvolveu complicações neurológicas graves, na sequência de uma dieta à base de “junk food. Para nos ajudar a dissecar este caso, convidámos o Drº João Vasco Barreira, médico Oncologista, que nos irá elucidar sobre as particularidades deste caso real e falar sobre os malefícios dos alimentos ultraprocessados.

O artigo em questão descreve o caso de um jovem inglês de 17 anos, que recorreu a uma consulta de Oftalmologia por diminuição progressiva da visão, que evoluiu ao longo de dois anos até ficar praticamente cego. Após várias avaliações foi-lhe diagnosticada uma neuropatia ótica bilateral (lesão dos nervos dos olhos) de causa inicialmente desconhecida.

Foram realizados vários exames, entre eles, ressonância magnética dirigida aos olhos e aos nervos óticos, e testes genéticos para a cegueira hereditária que se revelaram normais. As análises ao sangue mostraram uma anemia macrocítica (diminuição da quantidade de glóbulos vermelhos, com aumento do seu tamanho), sugestiva de um défice de vitamina B12 e ácido fólico. Contudo, os doseamentos de ambos encontravam-se dentro dos valores de referência. A pista decisiva recaiu sobre os níveis de homocisteína e ácido metilmalónico, que se encontravam elevados, sendo este perfil compatível com um défice funcional de vitamina B12.

De facto, investigando melhor os antecedentes do jovem, os médicos apuraram que ele já fazia injeções de vitamina B12 por lhe ter sido diagnosticada uma surdez neurossensorial aos 15 anos, decorrente de um défice grave de vitamina B12. Aos 14 anos tinha também sido avaliado pelo médico de família por queixas de cansaço, provavelmente no mesmo contexto carencial.

Após questionarem o jovem sobre os seu hábitos alimentares, este acabou por admitir que, desde a infância, mantinha uma dieta exclusivamente à base de batatas fritas, pão branco, presunto, salsichas e pringles, recusando alimentos com outras texturas. Referiu ainda que, diariamente, se deslocava à loja local de Fish & Chips para comprar a sua porção habitual de batatas fritas e outros snacks, e que, por vezes, se esquecia de administrar as injeções de vitamina B12.

As restantes análises acabaram por revelar outras carências importantes como défice de cobre, selénio e, sobretudo, vitamina D, bem como níveis elevados de zinco. A densitometria óssea revelou ainda uma osteopenia (condição de pré-osteoporose), não expectável para um jovem de 17 anos. De salientar que o seu índice de massa muscular (IMC) era normal.

O diagnóstico final foi o de neuropatia óptica (e surdez neurossensorial) de causa carencial múltipla, associada a um distúrbio alimentar. Foi tratado com suplementos alimentares com estabilização do quadro, mas sem recuperação da visão, e encaminhado para Psiquiatria pela Perturbação de Alimentação Seletiva. Esta perturbação não está associada a preocupações com o peso ou imagem (como acontece na anorexia), mas caracteriza-se por uma atitude inflexível e restritiva sobre a alimentação, com uma seleção muito limitada e repetitiva de alimentos, bem como uma recusa persistente em experimentar outros.

O caso supracitado foi publicado no jornal “Annals of Internal Medicine” em dezembro de 2019 e causou grande impacto na comunidade médica pela gravidade das sequelas e, simultaneamente, pela causa subjacente: uma carência nutricional severa, rara em países desenvolvidos. É um exemplo claro de como a alimentação baseada em produtos ultraprocessados — pobres em vitaminas e minerais, mas altamente calóricos e acessíveis — pode provocar sérias consequências para a saúde, mesmo em indivíduos com IMC normal. Identificar precocemente estes quadros é essencial, pois, se não tratados atempadamente, os défices nutricionais podem causar danos irreversíveis.

Referência Bibliográfica:
HARRISON, R.; WARBURTON, V.; LUX, A.; ATAN, D. Blindness Caused by a Junk Food DietAnnals of Internal Medicine, v. 171, n. 11, p. 859–861, 3 dez. 2019. DOI: 10.7326/L19‑0361. Publicado online: 30 set. 2019.